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29/11/2022 às 10h49min - Atualizada em 29/11/2022 às 10h49min

Sustentabilidade: empreendedorismo pode ser ecológico

Na Amazônia e no Estado do Pará, existem diversas iniciativas que desenvolvem a cadeia produtiva, a sustentabilidade e respeitando as identidades locais. Conheça alguns desses empreendimentos unindo

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Um empreendimento que é capaz de gerar renda, ao mesmo tempo em que contribui com a conservação dos recursos naturais e com o desenvolvimento social das pessoas que estão inseridas na cadeia produtiva, respeitando a cultura e identidade local, está alinhado com um conceito de negócio que tem ganhado cada vez mais importância no cenário atual, o empreendedorismo ecológico ou orientado para a sustentabilidade.

 

Foi ainda na década de 70 que o embrião do que hoje é a Fazenda Bacuri foi cultivado no município de Augusto Corrêa, região Nordeste do estado. Após adquirir uma propriedade no município, o economista nipo-brasileiro Henrique Osaqui observou a predominância natural do bacurizeiro e o potencial que isso representava. Foi quando teve início um sistema de manejo agroflorestal orgânico e certificado que se mantém até hoje. “Ele entendeu que para o desenvolvimento econômico, precisaria se pensar na Amazônia de forma diferente. Então, ele começou a fazer o manejo do bacurizeiro de maneira empírica, fazendo os tratamentos silviculturais”, conta Hortência Osaqui, uma das filhas de Henrique e que assumiu a Fazenda Bacuri a partir de 2009.

Na fazenda Bacuri, produtos ajudam comunidades locais.

Na fazenda Bacuri, produtos ajudam comunidades locais.

 Na fazenda Bacuri, produtos ajudam comunidades locais. | ( Divulgação )
 

Em 2009, quando Hortência decidiu voltar para a cidade do pai, eles puderam desenvolver todo o planejamento para a fazenda. “Ele acreditava que o Bacuri poderia mudar a vida das pessoas do entorno. Antes de ele falecer a gente fez todo um planejamento estratégico para a fazenda, ou seja, a gente trabalhou todo o processo primário, secundário e terciário. Só que tudo dentro da fazenda para que a gente levasse geração de emprego e renda para a comunidade local”, lembra Hortência.

Na indústria secundária, se definiu que a linha de produtos da fazenda seriam geleias e licores e o que se seguiu depois disso foi uma série de conquistas pioneiras. Em 2014 a fazenda inaugurou a primeira Agroindústria Familiar do Estado do Pará, em seguida lançou produtos com certificação 100% orgânica desde os frutos até o produto final e, ainda, abriu as portas para o mercado internacional, passando a ter selos para três mercados: Brasil, comunidade europeia e Estados Unidos.

Durante esse processo, a fazenda também começou a receber os primeiros compradores no local e em 2015 iniciou um projeto de turismo rural chamado Rota Amazônia Atlântica, sendo, hoje, o único roteiro de turismo rural no norte do Brasil validado pela Secretaria de Turismo do Estado do Pará (SETUR-PA) e Ministério do Turismo. “Temos artesões, produtores de farinha, o próprio pescador artesanal e eles começam a ter também esse espírito empreendedor e a olhar para Amazônia de forma diferente. A gente começa a fazer a roda girar no sentido de que todos possam ganhar. Então, quando o meu pai falava que o bacuri poderia mudar a vida das pessoas, era isso”.

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Na Xibé, Fernanda criou uma cadeia de produção sustentável

Na Xibé, Fernanda criou uma cadeia de produção sustentável

 Na Xibé, Fernanda criou uma cadeia de produção sustentável | ( Divulgação )
 

A perspectiva de desenvolver a própria comunidade está no centro do trabalho desenvolvido pela Xibé, marca de moda sustentável localizada em Alter do Chão, em Santarém. Criadora da marca, a designer de moda Fernanda Mourão lembra que o negócio foi fruto de uma conexão entre a moda sustentável e a ciência. “Dentro da universidade eles incentivaram bastante a gente a atribuir técnicas mais sustentáveis à nossa forma de criação e eu também cresci em Alter do Chão. Então, veio muito da minha vontade de alinhar os conceitos de moda sustentável e a ciência também, através da minha mãe que é professora e bióloga”.

Todo o processo de produção das peças, desde a criação até a embalagem que chega até o consumidor, tem uma preocupação com o meio ambiente e com o social. A marca optou por trabalhar apenas com tecidos de origem natural, com algodão orgânico. O tingimento e a estamparia das peças também são naturais, fazendo uso principalmente das plantas amazônicas, mas também de algumas plantas brasileiras, sendo que todas as plantas utilizadas são fornecidas por pequenos agricultores da Região Norte.

“Trabalhamos com algumas comunidades como da cidade de Belterra e a comunidade de Nova Canaã que são os nossos fornecedores de matéria prima vegetal. A gente também tem parceria com alguns pequenos negócios, principalmente para fornecimento da casca de cebola, que é algo que é muito descartado dentro da comercialização e que a gente acaba reutilizando para os nossos tingimentos”, explica Fernanda.

Quando uma peça confeccionada pela marca acaba naturalmente desgastando a cor ao longo dos anos, o cliente também pode devolver essa peça para a empresa fazer um rebanho de tingimento. “A preocupação com a sustentabilidade dentro da Xibé foi algo primordial desde a construção da marca. A gente optou por trabalhar agregando não somente essa parte ambiental, mas também a social”.

Também no município de Santarém, o conhecimento local, aliado ao conhecimento científico tem transformado a realidade não apenas dos empreendedores por trás da Deveras Amazônia, como das comunidades tradicionais locais. Através do trabalho de pesquisa que desenvolvem na região, os três fundadores da Deveras, os biólogos Valéria Mourão de Moura e Cláudio Monteiro, e a doutora em ciências biológicas e professora da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), Rosa Mourão, viram a oportunidade de geração de renda e desenvolvimento local.

“A gente trabalha com bioprospecção de produtos naturais e pesquisamos muito as frutas e ervas nativas da Amazônia em um trabalho muito próximo com as comunidades. Então, a gente via que nas comunidades tinham bastante frutas da região que, muitas vezes, não tinham uma utilização”, lembra Valéria. “Fazendo alguns testes em laboratório, resolvemos começar com a produção de geleia, que era algo mais simples e as pessoas começaram a gostar, então, surgiu a ideia de montar um bionegócio, com um foco mais voltado para estudar a biodiversidade amazônica”.

Não demorou para que a linha de produtos fosse ampliada, também, para os licores, conservas e até mesmo para uma linha de desidratados feitos com sementes de frutos amazônicos. “A gente faz toda a parte científica, em laboratório, desenvolve o produto e tem outros produtos que são desenvolvidos diretamente com a comunidade, como a conserva e a geleia de Vitória Régia”, conta Valéria.

Outro produto que pode ser desenvolvido a partir desse trabalho conjunto com a comunidade é o café de açaí, feito a partir do caroço que seria descartado. “O caroço não tem uma destinação correta e aí temos toneladas de caroço de açaí no Pará, então, alguns produtores que já extraíam a polpa do açaí, agora estão usando o caroço para fazer outros produtos e gerar mais renda”.

As muitas funcionalidades possíveis para o caroço do açaí foram estudadas também em Belém, pela engenheira de produção Ingrid Teles, empreendedora por trás da Ver-o-Fruto. “A Ver-o-Fruto nasceu de dois incômodos, um deles era a quantidade de resíduo de caroço do açaí que era despejado e o outro grande incômodo surgiu quando eu tive a oportunidade de participar de um Círio Fluvial e, ao término do Círio, a gente foi até um braço de rio na Ilha do Combu e eu vi a cena de um senhor tomando banho com a água do rio e pensei qual será a qualidade da água que essas pessoas utilizam?”.

Ingrid Teles desenvolve projetos usando produtos amazônicos

Ingrid Teles desenvolve projetos usando produtos amazônicos

 Ingrid Teles desenvolve projetos usando produtos amazônicos | ( Divulgação )

Na semana seguinte, quando foi para a faculdade, Ingrid pediu autorização para usar o laboratório para pesquisar se seria possível usar o caroço do açaí como um meio filtrante para levar um sistema de água potável para a população ribeirinha. “Eu fiz em pequena escala e consegui eliminar as bactérias e coliformes que estavam presentes na água, o que foi muito bom”, lembra, ao contar que, após a conclusão da graduação, veio a ideia de empreender na área. “Eu sempre tive vontade de ter algo quando eu saísse da faculdade, mas eu não sabia como fazer porque eu não tinha experiência, não tinha recursos, não tinha nada. Na primeira pesquisa de mercado aconteceu tudo o que não era para acontecer. Foi quando eu percebi que não dava para iniciar da forma como eu queria, mas que eu deveria mudar a minha estratégia se eu quisesse continuar com isso”.

Foi quando Ingrid procurou oportunidades com o que ela tinha em mãos, uma pequena quantidade de caroços de açaí já com a aplicação da tecnologia. Assim ela entrou no mercado de cuidados com a pele, desenvolvendo um sabonete, a partir do caroço transformado, destinado a peles oleosas, mistas e maduras. “Foi uma forma de co-financiar e entender como levar esse sistema de água potável para as pessoas das ilhas. Então, hoje, a cada sabonete vendido, R$1 é destinado para o sistema de tratamento de água e, graças a Deus, muitas coisas mudaram, também, em relação a como entender o negócio. Hoje, nós já estamos trabalhando no nosso primeiro sistema de tratamento de água com utilização da água do rio, que vai ser instalado, primeiro, na Ilha do Combu”, comemora a conquista.


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