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15/11/2017 às 11h02min - Atualizada em 15/11/2017 às 11h02min

Ministério Público investiga suspeita de adoções ilegais em Canaã dos Carajás

Pena para os infratores pode variar entre dois e seis anos. Promotor diz que o órgão não vai tolerar este tipo de prática nos hospitais do município

Kleysykennyson Carneiro - Jornal In Foco
Fotos: Ricardo Mesquita
A história é antiga, mas continua se repetindo em qualquer lugar no mundo. A mãe dá a luz a uma criança, mas não possui condições financeiras ou psicológicas para cria-la. Do outro lado, uma família deseja ter uma criança, mas, por algum motivo, a gravidez é inviável. De maneira informal, geralmente por intermédio de alguém, a mãe entrega o filho à nova família e, após um breve aperto de mão, o destino do recém-nascido passa a ser uma verdadeira incógnita, já que se sabe muito pouco ou nada da família em questão. O bebê é registrado como filho legítimo do casal e a vida segue como se nada tivesse acontecido.
 
A adoção “à brasileira” é comum em todo o país, mas o que muita gente não sabe é que a prática se caracteriza como crime e todos os envolvidos no processo podem pagar bem caro pelo desdém em relação à justiça.
 
O município de Canaã dos Carajás tem uma alta taxa de natalidade. Em média, 90 a 110 crianças nascem todos os meses no município. É sabido que a esmagadora maioria dos recém-nascidos são muito bem recebidos pelas mães. No entanto, há casos de bebês que não podem ser criados pelas suas famílias biológicas. Pelo processo natural e correto, do ponto de vista penal, o caso é encaminhado para o setor de cadastro de adoções, localizado no Fórum Municipal. A partir daí, a equipe responsável pelo setor procurará o melhor lar possível para a criança e ainda providenciará o atendimento psicológico à mãe que não pôde criar o filho recém-nascido.
 
Suspeitas
 
No entanto, várias denúncias informais chegaram ao Ministério Público dando conta de que alguns profissionais de saúde do município estariam intermediando adoções ilegais. Segundo as denúncias, os profissionais direcionariam as crianças para famílias interessadas na adoção, sem passar pelo devido processo legal. Algumas denúncias davam conta, inclusive, que valores estavam sendo cobrados pela intermediação.
 
Somente um caso foi confirmado até agora, como contou o Dr. Rui Barbosa, promotor de justiça em Canaã, durante entrevista. De acordo com ele, a criança, adotada ilegalmente em Canaã por uma família de Brasília-DF, acabou se tornando uma espécie de criada, não estava indo à escola e era tratada de maneira diferenciada dos demais filhos. “Virou uma ‘Cinderela’ da vida” definiu o promotor.


Dr. Rui Barbosa: "Mais cedo ou mais tarde os culpados serão descobertos."
 
O Ministério Público de Canaã está investigando as informações desde que elas chegaram aos ouvidos da promotoria. De acordo com o Dr. Rui, os supostos intermediadores estão correndo sério risco de perder o cargo que exercessem e ainda, no caso de médicos, enfermeiros e técnicos, o registro para o exercício da profissão: “Nós estamos investigando os fatos. Há uma série de punições recorrentes para quem for culpado. O MP está apurando isso, não vai condescender com este tipo de prática e mais cedo ou mais tarde os culpados serão descobertos.” O crime de tomar parto alheio como próprio está previsto no artigo 242 do código penal e prevê pena de 2 a 6 anos.
 
Em agosto deste ano, a promotoria do Ministério Público enviou uma notificação para a Secretaria de Saúde falando sobre as suspeitas do caso. No documento, constava ainda a recomendação de que fossem feitas orientações a todos os funcionários para que estes encaminhassem as mães, que manifestassem o desejo de doar os filhos para a adoção, à Justiça da Infância e da Juventude, de forma discreta e sem qualquer constrangimento.
 
O mesmo documento recomendava que o secretário de saúde orientasse cada profissional sob sua responsabilidade dos benefícios da adoção legal e também que denunciassem ao Ministério Público qualquer notícia de “adoção à brasileira” que tivessem notícia. A promotoria recomendou ainda que cópias do documento fossem afixadas em locais visíveis nas unidades de saúde que fizessem atendimentos de obstetrícia ou pediatria, incluindo os postos de saúde.
 
Adoção legal
 
De acordo com o Dr. Rui Barbosa, o cadastro legal funciona muito bem em Canaã e existe para evitar casos como a da criança que foi levada para Brasília, na modalidade de adoção ‘à brasileira’, e que acabou sofrendo com o descaso: “O foco é garantir a melhor família e a preocupação é sempre com o bem estar da criança. Canaã tem uma equipe muito boa trabalhando neste cadastro legal das adoções. Visitas são feitas às famílias e há todo o acompanhamento do processo de adaptação da criança ao lar” explicou o Dr. Rui. “Não há problema a mãe querer entregar o filho, mas existe esse cadastro sério que precisa ser feito para garantir as melhores condições para a criança.”
 
O cadastro acontece de maneira sigilosa e, conforme informou o promotor, com total seriedade. A lei não obriga que a mãe, que não possui condições, crie o próprio filho, mas exige que se respeite o processo: “Com a adoção legal, todos os direitos são garantidos, tanto para a família que adota, quanto para a criança. A única burocracia que existe é aquela para se verificar a melhor condição para a criança, pois precisamos garantir o total bem estar de todos.”
 
O promotor recomenda ainda que os interessados procurem o Fórum Municipal. O cadastro da adoção legal existe, é eficiente e absolutamente sigiloso. O órgão funciona de segunda a sexta-feira, das 08 às 14 horas, no bairro Vale dos Sonhos.
 
Secretaria de Saúde
 
A Secretaria Municipal de Saúde se manifestou através do seu gestor, o secretário Dinilson Santos. De acordo com ele, as recomendações foram recebidas e as orientações foram seguidas à risca. Dinilson se mostrou surpreso com as suspeitas, disse que a prática jamais será tolerada na pasta que dirige e que, caso haja comprovação dos fatos, os acusados devem responder pelo crime de acordo com o exigido pela lei.
 
O secretário explicou ainda que todos os funcionários envolvidos no setor de obstetrícia e pediatria estão devidamente orientados a respeito das adoções legais: “Todos sabem o que deve ser feito. Não vamos aceitar esse tipo de situação aqui no Hospital. Entendo que muitas vezes a mãe não tem condições de criar o filho e que precisa fazer a doação do recém-nascido para a adoção, mas sei que tudo precisa respeitar o processo legal para que todo mundo possa sair bem do caso.”
 
Dinilson disse ainda que um comitê intersetorial composto por várias Secretarias Municipais Conselho Tutelar e Judiciário para tratar deste assunto e qualquer outro que envolva crianças e adolescentes. O comitê começou a fazer uma meticulosa auditoria na Secretaria. A intenção é verificar, caso a caso, o que aconteceu com os nascidos vivos nos últimos anos. O secretário explicou também que uma parceria com o Cartório já está sendo feita e que, em breve, os processos de registro serão realizados dentro do Hospital Municipal. Isso, acredita o secretário, contribuirá para mais transparência na saúde de Canaã.
 
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